As mãos repousadas no regaço tocam o tecido áspero da saia de fazenda grossa,
no silêncio escuro da solidão que enche a casa.
Os ponteiros do relógio ressoam insistentes. O ar frio da sala.
Trémula, a mão calejada
avança para o calendário preso na parede e desenha uma cruz a vermelho.
Falta menos um dia.
É já quase sábado.
Pensa um sorriso, as emoções abandonaram há já algum tempo o seu semblante,
exceptuando as lágrimas fugidias que por ele deslizam, nas tardes em que decide pegar
no envelope, já tão amassado, com fotografias a preto e branco de pessoas
com fatos de cerimónia
em poses cerimoniosas.
É já quase sábado.
É já quando:
o motor do carro a cortar o silêncio da rua
a porta do carro a fechar, enquanto os pequenos passos apressados
a campainha
e finalmente o sorriso largo
a pequena mão contra a sua
tantas histórias para ouvir
tantas palavras a espantar as teias de aranha, a semana longa, pesada e vazia
o luto carregado e as memórias dos que não partem
as horas e os compassos do tempo só
É já quase vida.
É já quase sábado.
(... may(be) not..) "Seremos nós neste mundo apenas canetas com tinta com que alguém escreve a valer o que nós aqui traçamos?" Álvaro de Campos
quinta-feira, maio 26, 2011
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