terça-feira, maio 29, 2007

tempos de meninice

Lembram-se da composição da vaquinha? "Eu gosto muito da vaquinha porque ela dá leitinho
para os meninos ficarem grandes e fortes, e come muita ervinha"
As minhas nunca foram assim.
Lembro-me de fazer composições sobre a harmonia, com muitos arco-íris,e meninos de mãos
dadas, sobre paz e amor. Eu devia ser muito hippie quando era mais pequena.

E fazia um desenho muito giro e colorido a acompanhar o texto, e depois ficava a olhar
para o balão à espera dos outros meninos. E tirava Excelente e a minha professora
da primária dizia "Depressa e bem há pouco quem, mas há a Sofia quem".
Agora que penso nisso, a construção frásica da minha professora não era grande coisa.
Talvez não fosse tão boa professora.

De estudo do meio, lembro-me do livro (eram todos "Bambi"'s), e de uma imagem do Salazar
que nunca mais me esqueci. Fazia-me lembrar o meu avô quando punha aqueles óculos de massa
grossos como se usava então. É a única parte que me lembro bem também, essa em que
falam da implantação da república (5 outubro de 1910), e do marechal gomes da costa.

Foi também na primária que conheci o hino português completo. E ainda sei algumas quadras de cor
(para além da letra óbvia que se canta).

O 5º ano também foi engraçado. Continuava a ter educação musical, cuja professora eu nunca gostei
(e o sentimento era completamente mútuo). Tinha na mesma coro e piano, com um professor meio sinistro
que me fazia lembrar o Edgar Alan Poe, sempre de preto, e que sempre associei aos Silence Four.
Vá-se lá saber.
A minha professora de História era muito gira. Tinha traços de alemã, cabelo muito loirinho quase branco,
liso, olhos claros e para além disso era muito redondinha. Fazia-me lembrar uma cebola, que virava tomate
quando se ria, porque ficava muito corada e ria-se muito. Costumava contar piadas que
não tinham assim tanta piada, e nós esforçavamo-nos por nos rir com ela, enquanto eu me ria mais com a imagem
daquela cebolinha a rebolar de tanto riso pela sala.

Outros tempos.

(na foto:imagem retirada do filme "Le fabuleux déstin d'Amélie Poulin")

segunda-feira, maio 28, 2007


Hoje, no autocarro (claro!), ouvi mais uma frase daquelas:

"Então, D.Rosa, como vai?
Andando e gemendo, não é?"

É mesmo isso! Há que ser positivo!
É com cada pérola!...


(em que altura da vida é que se desiste de querer?)

(photo taken by me)

sexta-feira, maio 25, 2007

Tant pis





Estava a trabalhar, no escritório, quando ouviu o peso grosso das bátegas de chuva no telhado. Num impulso, levantou-se e foi abrir os estores da janela, atrás de si.
Ficou, muda, a olhar a volência da chuva, sôfrega, varrendo a rua, as árvores. Sentia o frio percorrer-lhe a espinha, entrar-he no pescoço, no peito. Arrepio.
(Que importa?)
A rua estava vazia- ou seria o reflexo de si?
Nada era importante.
A chuva, só a chuva.
Os seus olhos preenchiam-se do cinzento do mundo exterior (ou seria, novamente, aquela realidade apenas parte de si?).
Perdiam a cor. Perdiam a expressão. Perdiam vida.
Não sentir.

A chuva batia-lhe violentamente, ininterruptamente. Jorrava em cascata sobre si, preechendo-lhe todos os sentidos. Não, não sentia. Via.
Na casa em frente, acendeu-se uma janela, a mais pequena delas todas.
Um vulto sorriu. Ele.
Ela sorriu também. Qualquer coisa se agitava agora em si - sentia.
Ficaram ali, num quadro imóvel, sorrindo à chuva. Os momentos de maior entendimento e intimidade são sempre preenchidos pelo silêncio.

(photo taken by me)

Náusea

Tudo me parece tão vago de sentido. Tão pobre de vida.
Sinto (como Fernando Pessoa) uma enorme náusea de tudo. Do ser, do existir, do estar.
O branco.
O vácuo interminável que nos suga para dentro de coisa nenhuma.
Sinto vontade de vomitar o Mundo de mim para fora.
E depois reconstruir tudo, a partir do Grande Nada, o estado primordial das coisas,
(mesmo pré-primordial), o branco que fere, aquele sítio anterior a todos os sítios, mesmo antes de haver sítios, antes de haver chão e céu e terra e água e cor e vento e gravidade e todas as leis da física, e matemáticas, e morfossintáticas, e toda e qualquer noção de forma, de pensar, de lógica e raciocínio, antes de haver filosofia, e psicologia, e psiquiatria, e todas as grandes descobertas do Homem que destruíram a Humanidade. Um estado de entropia máxima (mas como, entropia, se não há física?). Um estado que nem é estado porque não há estar, não há tempo, e finalmente e principalmente, não há ninguém.
.....
Mas porque haveria eu de reconstruir o Mundo, afinal? Para testar as capacidades de auto-destruição do que crio? Mas, já sei, são elevadíssimas. E qual a utilidade desta experiência afinal? Que me interessa a mim criar algo que será infeliz, torturado e escravo de si até que se acabe?

Vou dar o projecto por terminado. Afinal ficamos assim.

(texto já antiguinho)

sexta-feira, maio 18, 2007

a troça esconde a coragem de abalar os alicerces


"a troça esconde a coragem de abalar os alicerces"

(in Inversus, novembro 2006)

E tenho dito!


(Para todos aqueles que são campeões em tudo, os que sempre foram príncipes na vida,
os que nunca levaram porrada, todos aqueles que se julgam semideuses e ímpares neste mundo)

domingo, maio 13, 2007


"Vê moinhos? São moinhos.
Vê gigantes? São gigantes."

"Impressão Digital", António Gedeão


(acho que sem full view não se consegue perceber o quadro)

sexta-feira, maio 11, 2007

metas


"À procura, procura do vento. Porque a minha vontade tem o tamanho de uma lei da terra.
Porque a minha força determina a passagem do tempo. Eu quero. Eu sou capaz de lançar um grito para dentro de mim, que arranca árvores pelas raízes, que explode veias em todos os corpos, que trespassa o mundo. Eu sou capaz de correr através desse grito, à sua velocidade, contra tudo o que se lança para deter-me, contra tudo o que se levanta no meu caminho, contra mim próprio.
Eu quero. Eu sou capaz de expulsar o sol da minha pele, de vencê-lo mais uma vez e sempre.

Porque a minha vontade me regenera, faz-me nascer, renascer.
Porque a minha força é imortal"

José Luís Peixoto, Cemitério de Pianos