sexta-feira, maio 25, 2007

Tant pis





Estava a trabalhar, no escritório, quando ouviu o peso grosso das bátegas de chuva no telhado. Num impulso, levantou-se e foi abrir os estores da janela, atrás de si.
Ficou, muda, a olhar a volência da chuva, sôfrega, varrendo a rua, as árvores. Sentia o frio percorrer-lhe a espinha, entrar-he no pescoço, no peito. Arrepio.
(Que importa?)
A rua estava vazia- ou seria o reflexo de si?
Nada era importante.
A chuva, só a chuva.
Os seus olhos preenchiam-se do cinzento do mundo exterior (ou seria, novamente, aquela realidade apenas parte de si?).
Perdiam a cor. Perdiam a expressão. Perdiam vida.
Não sentir.

A chuva batia-lhe violentamente, ininterruptamente. Jorrava em cascata sobre si, preechendo-lhe todos os sentidos. Não, não sentia. Via.
Na casa em frente, acendeu-se uma janela, a mais pequena delas todas.
Um vulto sorriu. Ele.
Ela sorriu também. Qualquer coisa se agitava agora em si - sentia.
Ficaram ali, num quadro imóvel, sorrindo à chuva. Os momentos de maior entendimento e intimidade são sempre preenchidos pelo silêncio.

(photo taken by me)

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